segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Setembro Amarelo, Banzo e Auto-imolação!

Setembro Amarelo é uma campanha sobre a prevenção do suicídio para alertar a população brasileira e mundial sobre o assunto de extrema importância. As manifestações de conscientização ocorrem no dia 10 de setembro, desde 2014, através da exposição da cor "amarelo" em espaços públicos e privados. Doenças como câncer e a AIDS, há duas ou três décadas as pessoas não gostavam de proferir seus nomes. Ou seja, eram verdadeiros tabus. Logo, os governantes e a população presenciou o número de vítimas aumentar significativamente. Com isso, foi preciso um empenho coletivo de personalidades e organizações para tornar essas doenças algo comum através de campanhas de prevenção para reverter o triste quadro.(imagem 1)

O suicídio é problema de saúde pública, mas é um assunto que enfrenta os mesmos tabus do câncer e da AIDS, pois as autoridades políticas e médicas atuais não estão atentos a este mal e segundo os números do site www.setembroamarelo.org.br, 32 brasileiros cometem suicídio por dia, taxa superior às vítimas da AIDS e da maioria dos tipos de câncer. Por conseguinte, o suicídio é um mal silencioso, as pessoas não conversam sobre o assunto e, por medo ou desconhecimento, não percebem os sinais de que uma pessoa próxima está com ideias suicidas. Mas há uma esperança de mudança nesse cenário. Pois, segundo a Organização Mundial da Saúde, 9 em cada 10 casos podem ser prevenidos. Logo, é necessário a pessoa buscar ajuda e quem está à sua volta ter a perspicácia de notar determinados comportamentos que podem levar ao suicídio.

Porém, infelizmente este assunto não pode ser tratado como uma novidade pela sociedade brasileira, pois desde a introdução do trabalho escravo no Brasil o suicídio conhecido na época como “banzo” se tornou mais uma das várias formas de resistência utilizadas pelos escravos contra à escravidão ao rompimento dos laços matrimoniais e familiares promovidos na diáspora. Logo, para corroborar que o banzo - suicídio - estava super presente na sociedade escravagista brasileira, leia O assunto publicado pelo Jornal do Commercio, na cidade do Rio de Janeiro, em 22 de junho de 1872 "Apareceu ontem enforcado com um baraço [corda de fios de linho], dentro de um alçapão, na casa da rua da Alfândega, nº 376, sobrado, o preto Dionysio, escravo de D. Olimpya Theodora de Souza, moradora na mesma casa. O infeliz preto, querendo sem dúvida apressar a morte, fizera com uma thesoura pequenos ferimentos no braço ...” O termo "banzo", há tempos, era tratado como uma doença. Em 1799, Luiz António de Oliveira Mendes apresentou, na Academia Real de Ciências de Lisboa, um estudo sobre “as doenças agudas e crônicas que frequentemente acometem os pretos recém-tirados da África”. O banzo estava entre elas. Os sintomas eram? Os escravos ficavam entristecidos, paravam de falar e, deixavam de se alimentar, mesmo “oferecendo-se-lhes” – afirma o médico – “as melhores comidas, assim do nosso trato e costume, como as do seu país...”, falecendo pouco tempo depois.

No século XIX(19), as primeiras teorias psicológicas, sobre o comportamento dos escravos vítimas de "banzo" foi reconhecido como distúrbio mental. Como descreveu, em 1844, Joaquim Manoel de Macedo, na tese médica intitulada Considerações Sobre a Nostalgia, afirma o seguinte: “[...] estamos convencidos de que a espantosa mortandade que entre nós se observa nos africanos, principalmente nos recém-chegados, bem como de que o número de suicídios que entre eles se conta, tem seu tanto de dívida a nostalgia [...]”. Os escravos geralmente usavam esta palavra quando sentiam saudades ou falta muito dolorosa de seu lugar de origem(África) ou de uma pessoa em especial, muitos morriam de banzo, ou melhor, durante o período do banzoCom o passar dos anos, a assimilação entre nostalgia e banzo se tornou corriqueira. Com isso, segundo o Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa, de 1875, de Joaquim de Macedo Soares, é possível ler a seguinte definição: “banzar: estar pensativo sobre qualquer caso; triste sem saber de quê; tristeza e apatia simultânea; sofrer de nostalgia, como os negros da Costa quando vinham para cá, e ainda depois de cá estarem”.
Logo, o que mais foi noticiado pelo Jornal do Commercio no século XIX(19), foram ocorrências de suicídio associadas a doença mental. Ou seja, ocorrências de mortes voluntárias associadas a delírios: “Valentim, escravo de Faria & Miranda, estabelecidos na rua dos Lázaros nº 26, sofria há dias violenta febre, e era tratado pelo Dr. Antonio Rodrigues de Oliveira. Anteontem [20 de maio de 1872], às 9 horas da noite, ao que parece, em um acesso mais forte, Valentim feriu-se com um golpe no pescoço”. Outras vezes se reconhecia explicitamente a loucura: “Suicidou-se ontem [8 de março de 1872] à 1 hora da tarde, enforcando-se, a preta africana Justina, de 50 anos, escrava de Narciso da Silva Galharno. O Sr. 2º Delegado tomou conhecimento do fato e procedeu a corpo delito. Consta que a preta sofria de alienação mental”. 

Nos dias atuais, a palavra “nostalgia”, difundida na literatura, é sinônimo de “saudade”, um sentimento. Este rótulo – assim como o de banzo – provavelmente escondeu uma variedade de problemas psicológicos ou psiquiátricos, que poderia ser desde depressão à esquizofrenia; ou poderia ser questões provocadas pela desnutrição devido à diáspora, por doenças contagiosas, ou por consumo excessivo de álcool e drogas – como a maconha, apreciada por muitos escravos, que a chamavam de “pango”, em que muitos cativos eram obrigados a utilizar máscara de flandres(imagem 2); ou pela compra excessiva de joias por parte dos escravos domésticos que viviam nas urbes brasileiras. Já que, comprar a alforria não era algo tão permissivo dentro da escravidão. Assim, o que se deu foi a disseminação de forma errônea das autoridades políticas, médicas e letradas da época sobre o "suicídio" a fim de escamotear o verdadeiro problema que assolava os negros africanos escravizados, servindo também como camuflagem para os constantes assassinatos cometidos na relação senhor-escravo dentro da penosa vida no cativeiro das urbes e das zonas rurais do Brasil. 

Assim como os negros africanos sofriam com a escravidão e utilizavam o suicídio como uma forma de resistência, isto não fora diferente com as populações indígenas, em que estas são afetadas até hoje, como relata o site www.jovensindigenas.org.br, e a Escola Nacional de Saúde Pública/FioCruz. que devido a "hipótese do recuo impossível" os indígenas não tem mais como recuar diante do avanço cultural, político, religioso, tecnológico e econômico da sociedade Ocidental(nós), não existem mais florestas em que o índio possa se esconder e se proteger dos tentáculos capitalistas. Por  exemplo, a aldeia dos Guarani-Kaiwá encontra-se no perímetro urbano de Dourados(MS), isto faz com que, a inserção ocupacional e social dos jovens indígenas seja extremamente dificultosa, restando aos mesmos a prostituição e o subemprego, em que, ainda são obrigados a assistirem a destruição da cultura indígena dia após dia. Logo, a auto-imolação foi a saída encontrada para a sobrevivência de suas culturas. Com isso, o fato de 6 jovens  Kaiwá terem-se eforcado num curto período de duas semanas, e no ano de 1987 até agosto de 1991 a imprensa local ter noticiado 55 suicídios entre os jovens indígenas de 12 a 20 anos de idade. Isto foi o suficiente para alertar a existência de uma epidemia de suicídios e chamar atenção das autoridades políticas e médicas locais. Mas os números de vítimas pode está subestimado, não é comum na cultura indígena falar sobre esse assunto, acredita-se que o número de suicídio esteja em constante ebulição, já que,  os indígenas continuam privados de suas atividades econômicas(caça, pesca e agricultura de subsistência) e ainda possuem um paredão com cerca de 20 milhões de anos  de cultura intransponível  para que, possam ter uma inserção mínima em qualquer área produtiva do mercado de trabalho capitalista consumista. Por conseguinte, os pesquisadores tem de se contentar com números incertos publicados pela imprensa preconceituosa, parcial, local e leiga para continuar analisando sobre mais esse tipo(suicídio) de crueldade vivenciada pelas populações indígenas do Brasil. (imagem 3)




(imagem 1)
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(Imagem 2) 
Máscara de Flandres - tinha o objetivo de impedir que os escravos ingerissem alimentos, entorpecentes, bebidas alcoólicas ou terra.
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(imagem 3)

















Fonte: 



KARASCH, Mary C. A vida dos escravos no Rio de Janeiro (1808-1850).

CHALHOUB, Sidney. Visões de liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na corte.

CARVALHO, Marcus. Liberdade: rotinas e rupturas do escravismo no Recife, 1822-1850.


BERLIN, I. N. Suicid among American Indian Adolescents

HERNANDEZ, T. J. M. Estudo do Perfil da Malária em Comunidades Yanomámi da Região Amôzanica (tese de Mestrado)

GRUMBER, G. Por que os Guaraní-Kaiwá estão se matando?


Filme: Quanto vale ou é por quilo?

www.jovensindigenas.org.br

www.setembroamarelo.org.br

Revista: Aventuras na História para viajar no tempo.

Escola Nacional de Saúde Pública FioCruz





Um comentário:

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